Coluna publicada na edição de domingo do DC e de final de semana do Santa, a última da interinidade:
Já fez parte da cultura política de Santa Catarina, para não dizer do Brasil, que cabia ao Estado sustentar grandes lideranças políticas e seus herdeiros. Não é por outro motivo que até hoje uma neta de Hercílio Luz recebe pensão mensal do governo estadual. Ou que três irmãs de Fulvio Aducci, governador por 25 dias em 1930, tenham ganhado o benefício em lei aprovada no governo Ivo Silveira, em 1968. O trágico acidente aéreo que matou o senador Nereu Ramos, o governador Jorge Lacerda e o deputado Leoberto Leal, em junho de 1958, resultou, dois meses depois, na aprovação de uma pensão mensal a suas viúvas.
Um dos últimos resquícios dessa cultura política é o dispositivo da Constituição estadual que dá a ex-governadores pensão mensal de R$ 24,1 mil – equivalente ao salário de um desembargador. Não importa se eleito ou se assumiu o cargo por renúncia por titular. Não importa o tempo que ficou no comando do Estado ou que a pensão seja maior do que o próprio salário de governador.
Atualmente, nove ex-governadores e três viúvas recebem o benefício. O tema começou a ganhar um destaque maior em 2006, quando Luiz Henrique da Silveira (PMDB) renunciou ao governo para concorrer à reeleição e o cargo foi herdado pelo vice Eduardo Pinho Moreira (PMDB). Apesar de governar o Estado por oito meses, ele passou a ter direito à pensão em 2007. O fato se repetiu ano passado, quando o mesmo LHS renunciou para concorrer ao Senado e o vice Leonel Pavan (PSDB) completou o mandato.
Desde então, são permanentes os questionamentos de que a pensão vitalícia acabou virando moeda política na hora de fechar alianças e chapas majoritárias. A partir do benefício concedido a Pinho Moreira, o deputado estadual Pedro Baldissera (PT) iniciou uma verdadeira cruzada contra as aposentadorias de ex-governador. O argumento político é até simplório: um agricultor de sua base, no Oeste, precisa trabalhar 35 anos para se aposentar com um salário mínimo. Mas os argumentos jurídicos, alinhados pela advogada Anilse Slongo, têm conseguido vitórias pontuais. Em 2007, uma ação do deputado no Tribunal de Justiça conseguiu reduzir pela metade a pensão de Pinho Moreira. O peemedebista disse que achava justo o valor e nem recorreu. Quem recorreu foi o próprio deputado petista, alegando que todo o benefício era ilegal.
NO STF
Em Brasília, no Supremo Tribunal Federal (STF), o tema foi parar nas mãos do ministro Carlos Ayres Britto. Na última quinta-feira, Baldissera conseguiu uma audiência com o ministro e teria ouvido dele que o STF considera ilegal qualquer pensão a ex-governadores concedida após a Constituição de 1988.
Ayres Britto teria dito que deseja levar a ação específica sobre a pensão de Pinho Moreira para julgamento em agosto. Confirmado o entendimento, o atual vice-governador perderia o benefício e estaria encaminhada a jurisprudência para que os demais governadores – eleitos ou tampões – que chegaram ao cargo depois de 1988 também fiquem sem a aposentadoria.
Seriam eles Casildo Maldaner, Paulo Afonso Vieira, Leonel Pavan e a viúva de Vilson Kleinübing. O senador LHS abriu mão do benefício, enquanto o deputado federal Esperidião Amin, eleito em 1982 e 1998, continuaria a receber por causa do primeiro mandato. Colombo Salles, Jorge Bornhausen, Henrique Córdova e Antonio Carlos Konder Reis também seguiriam aposentados.
Se o STF confirmar que o mandato de governador não dá direito a amparo vitalício a quem o exerce e a seus herdeiros – por mais importante, realizador e bem-sucedido que tenha sido o eleito – deixará claro que a cultura política está mudando. A sociedade catarinense, para não dizer a brasileira, não aceita mais que o Estado conceda a seus poderosos o abrigo que não dá à grande maioria de seus cidadãos.