O caminho para a dívida dos Estados é a mesa de negociação, não o plenário do Supremo Tribunal Federal. A opinião é do economista Raul Velloso , PHD pela Universidade de Yale (EUA) e com passagens pela secretaria de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento e dos conselhos de administração do BNDES e da Embraer. Ele acredita que a decisão tomada pelos ministros cria as condições para um acordo em que União e Estados estejam dispostos a ceder.
Leia a entrevista.
Com a suspensão do julgamento, a Tese de SC sai enfraquecida?
Não, eu acho que aconteceu exatamente o que poderia acontecer. Reflete uma vitória da estratégia adotada pelo governador catarinense. Em um artigo publicado segunda-feira no jornal O Globo, que foi citado no julgamento pelo ministro Luiz Fux, eu dizia que o Supremo deveria criar condições para negociação em bases mais equilibradas. A decisão dos ministros cria essa prorrogação por 60 dias para que os Estados, com uma condição de barganha menos desfavorável, pudessem caminhar junto com a União para uma solução equilibrada.
O senhor acredita que não adianta a União ou os Estados ganharem o julgamento?
Exatamente. Esse não é um assunto do STF. O que ele costuma fazer é avaliar se um assunto fere ou não a constituição, em geral. Não vai entrar em detalhes sobre os problemas dos Estados, porquê essa situação chegou onde chegou, como pode evoluir. Eles diriam sim ou não. Eles viram que dizer sim ou não significaria, nos dois casos, um grande prejuízo para um dos dois lados. Por isso, a saída é voltar à mesa de negociação com bases mais equilibradas. Agora, provavelmente essa mesa terá um novo governo (do vice-presidente Michel Temer, do PMDB). Porque esse aí (de Dilma Rousseff, do PT), já tinha esgotado sua forma de atuar. Aí ver o que se pode fazer para atender as necessidades dos Estados sem prejudicar o que temos de preservar na ação financeira do governo. Esse é o caminho. Antes estava um impasse, o governo federal numa posição bastante prepotente, arrogante. Agora cada parte poderá expor seus problemas e necessidades para chegar a um acordo. O STF não vai entrar em mérito de nada. Se não tiver acordo, vai julgar para um lado ou para o outro.
O caminho é um acordo em que a União dê algum desconto na dívida dos Estado, mas que não seja no volume proporcionado pelo recálculo com juros simples?
O que está faltando nessa história é que se estabeleça um critério e depois se veja qual a melhor maneira de chegar nele. A negociação feita em 1998 resultou em uma dívida sem fim. A sensação é essa. Não é que foi mal feito. Havia incerteza sobre o que ia acontecer na economia, como ia se comportar a arrecadação dos Estados. Com as incertezas, não se sabia se a dívida teria um fim na data prevista, em 2028, ou se ia restar um grande resíduo. Está se encaminhando para o grande resíduo. A dívida não era sustentável. Como dar autonomia aos Estados se eles estavam condenados a uma dívida que iria se eternizar? O primeiro critério tem que ser que a dívida não pode ficar sem fim. O segundo é não esquecer que estamos em meio a uma crise gravíssima de liquidez nos Estados em curtíssimo prazo. Alguns Estados pararam de pagar o pessoal. Isso tem que ser levado em conta. A única forma de financiar os Estados é permitir que eles paguem menos neste e no próximo ano. Os Estados não tem maquininha de emitir moeda como o governo federal tem.
Em relação à Tese de SC, está correta a avaliação de que “variação acumulada” da taxa Selic é juro simples?
Não é uma questão de ser correta ou não. É uma possibilidade, uma questão de opção. Se perguntar quem adota isso, vai ver que no próprio governo federal existem situações em que os juros simples são adotados. Mas esse não é o ponto. Eu sempre entendi que quando SC entrou com essa história de juros simples porque aquela ideia de que a dívida se eterniza, muda. Para mim foi uma forma de dizer “vamos entrar numa mesa de negociação de uma forma menos desfavorável”. Nisso vejo sucesso na estratégia do governador Raimundo Colombo.
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