
Na ampla cobertura de Adenor Bachi, 49 anos, a luz do Guaíba do final da tarde de dezembro da Capital lembra a luminosidade dos Emirados Árabes Unidos. É um sorridente Ade, seu apelido familiar, que recebe a mim e ao fotógrafo Genaro Jones no 20º andar.
Seu aperto de mão é forte, bem serrano. Seu sotaque ainda guarda no final de cada frase bem construída e em bom português o acento do mapa italiano de Caxias do Sul.
– Mandei meu irmão se infiltrar no meio da torcida do Corinthians certa vez. Queria saber o que eles diziam, o que pediam. O Miro voltou impressionado. Disse “Ade, eles não reclamam nada só apoiam, só incentivam”.
– É uma torcida diferente? – eu pergunto.
– Sim. A Geral, no Olímpico, e a Popular, no Beira-Rio, apoiam o tempo inteiro. Mas os outros setores do estádio não agem sempre assim. No Corinthians parece que todos aplaudem a toda hora. Depois, claro, se nada deu certo, eles cobram a conta, sempre pesada … – ele ri.
Três minutos depois, Ade já não é mais Adenor, que escapa. Na confortável poltrona da sala, surge o técnico Tite, um dos treinadores da elite do futebol brasileiro, o atual “professor” do Corinthians, campeão gaúcho pelo Caxias, brasileiro pelo Grêmio, latino pelo Inter. Títulos que o tornam diferente e especial no cenário local, habitat do atual técnico da Seleção, Mano Menezes, do antigo, Dunga, de um mais velho ainda, Felipão.
– Sou da escola de Ênio Andrade, respeito Carlos Froner, os acompanhei desde que era jogador. Lia as colunas do professor Ruy Carlos Ostermann e o Lauro Quadros quando tentava entender um pouco mais de futebol, ver além do que eu observava na época, quando era jogador de futebo.
Seu horizonte não se encerra mais em Torres, praia do sonhos de todo o caxiense. Se estendeu, cidadão do mundo que é. Agora, o centro de ação é São Paulo, seu contrato vai até a última semana de 2011 e ele precisa lidar com Ronaldo e Roberto Carlos entre outros cobras. Ganhar os títulos que 2010 escondeu do Timão.
– Admiro os dois. São especiais como atletas, como seres humanos os conheci agora. O Roberto é um gurizão, sempre de bom humor. O Ronaldo é igual com todos. Trata todo mundo bem. Respeita o presidente. E o que é mais importante. Reverencia também o porteiro do clube.
Tite vai adiante.
– Sabe que o Ronaldo deu R$ 5 mil para cada funcionário do Corinthians? Não avisou ninguém. Foi lá, discretamente, chamou cada um e estendeu seu Natal. Ele é uma pessoa simples. Trata todo mundo igual.
Um ano, nove meses e sete dias de Caxias, entre 1999 e 2000, o jogaram no cenário no Gauchão, o Olímpico o tornou nacional, o Beira-Rio o consolidou, o Corinthians puxouo treinador, o Palmeiras imitou o rival, o Timão o chamou de novo depois de 2005.
Ele se empolga ao falar de Ronaldo. Puxa o Toshiba, liga e mostra alguns lances de jogadas (uma delas seus volantes de soltam, avançam, entram pela área e marcam gols de fazer corar centroavante) que usa em palestras:
– Olha, a qualidade do passe, a conclusão, a inteligência. O Ronaldo antevê as jogadas. Ele é mesmo um jogador diferente, diferenciado.
O Fenômeno pode ser tornar um perigo de cem quilos de peso e de uma tonelada de criatividade para as defesas da Dupla na Libertadores. O Corinthians é um dos seis brasileiros, ao lado de Inter, Grêmio, Santos, Cruzeiro e Fluminense, na competição que dá direito ao jato Brasil/Mundial de Clubes. Quando eu faço a lista dos classificados, ele pensa 30 segundos, começa a falar em táticas, lembra seu glorioso 3-5-2 gremista, sua matadora linha de quatro colorada. Toma fôlego e entra no torneio latino:
– Nunca vi uma Libertadores tão qualificada. É só time de ponta. Vou para a minha sexta Libertadores (duas como jogador) e acho que vai ser a mais competitiva da história. O nível técnico das equipes brasileiras é altíssimo, com bons jogadores, mais os reforços, e ainda técnicos experientes.
Tite pede licença, levanta, some durante alguns minutos e volta como Ade.
Na mão, dois tipos de refrigerantes e um suco. Serve o líquido gelado. Desaparece de novo. Retorna com dois pratos.
– É o pavê da Rose (sua mulher). Ela deixou para vocês…
O doce é ótimo, caseiro, feito, talvez, com receita das vovós. Enquanto eu o fotógrafo aprovamos o doce, Adenor volta como Tite e lembra o que mudou nos seus 10 anos como treinador de futebol:
– Meu conhecimento tático é muito maior e o meu método de trabalho foi se aprimorando. Sou bem mais experiente, claro. Mas, ao mesmo tempo, acho que o torcedor está muito mais informado, conhece melhor o treinador, jogador e dirigente. Exige mais e tem mais base.
De Abu Dhabi, de onde voltou no dia 20 de setembro, ele pescou uma certeza:
_ O Inter tem mais possibilidades de vitória do que em 2006. Por ele e pelo adversário, que atravessa uma crise técnica grande.
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