O Rio Grande comoveu-se esta semana com o assassinato do gaiteiro Olívio Dias em frente a uma câmera, dentro de um ônibus na Região Metropolitana. Depois de fazer o que mais gostava, tocar gaita em São Leopoldo, Olívio, que era morador de Caxias do Sul, voltava para casa em Novo Hamburgo.
Pilchado de alto abaixo, na companhia de sua gaita inseparável, que carregava a tiracolo, Olívio conversava efusivamente com o cobrador e uma passageira quando sobreveio a ação de um assaltante. O gaiteiro reagiu, e foi um alvoroço no ônibus. Não deveria ter reagido, é o que prescrevem os manuais, mas se vê nitidamente nas imagens que ele o fez no ímpeto, diante de uma situação que o indignou. Aproveitou um movimento “técnico” do assaltante, que se virou de costas para esconder a arma, e tentou acertá-lo meio que na volta do braço. Deu-lhe dois safanões. Surpreendido, o ladrão atirou. Olívio caiu e ainda tentou reerguer-se, mas cambaleou e tombou de vez, agarrado à gaita.
A cena é clássica do cotidiano das regiões metropolitanas e da periferia das grandes cidades. O ônibus cheio de trabalhadores, passageiros em pé e sentados, a volta para casa, uma conversa animada, a ação do assaltante. Acrescente-se a peculiaridade da pilcha, da gaita, do porte avantajado do gaudério, do chapéu e do lenço no pescoço, e todos esses ingredientes ajudam a compor um cenário familiar para a tragédia, que alcança, à traição, uma figura simpática e cara aos rio-grandenses, a figura do gaúcho.
O assassinato do gaiteiro, assim, filmado e mostrado na tevê em todo seu desenlace, nos alerta do que já sabemos, nos reforça a mensagem de que a violência, o assalto, a morte estão permanentemente à espreita, podem aparecer assim, em uma viagem do transporte coletivo, em uma esquina, na sinaleira, no meio da praça, no portão da garagem, como é frequente. Resta seguir vivendo, não há outra saída, sair às ruas, tentar levar uma vida normal. Tocar gaita, inclusive, conversar com as pessoas, com o cobrador de ônibus, manter o humor e as boas relações. Resta seguir vivendo sem paranoia, na medida do possível, mas atentos ao redor. A morte do gaiteiro Olívio nos comove e nos alerta a repassar lições do manual de sobrevivência na selva.