Ó! Mais um capítulo de “Jô na estrada”!
Durante toda a vida, Jô pensara sobre esse assunto. Prostituição. Não que fosse algo que a obcecasse ou que minimamente a preocupasse, nada disso. Tratava-se apenas de uma fantasia recorrente.
Aquilo que Maia falara acerca do desejo animal dos homens, saber que podia ser capaz de despertar instintos tão básicos que um homem a possuiria sem sequer conhecê-la ou saber o seu nome, andar por um lugar seminua e ser avaliada pelos machos como uma escrava à venda, para ser tomada e usada de todas as formas, tudo era muito sensual, tudo era muito carnal, fazia com que se sentisse fêmea, mais até do que mulher. Quando alimentava essas fantasias secretas, repetia baixinho para si mesma:
— Queria ser uma cadela…Uma cadela…
Mas não passavam de fantasias. Jô nunca sequer cogitara de colocá-las em prática. E agora vinha Maia com ideias…
Depois, quando ficou mais madura, quando estava preparada para se soltar e voar, o fogo entre eles havia se extinguido, o sexo tornara-se protocolar. Jô se conformava. Concentrava-se nos filhos, na vida familiar, nas saídas com os amigos, nos exercícios na academia, no seu trabalho, nas suas leituras…
Será que Fábio transava com outras? Será que frequentava prostitutas? Pagava para possuir mulheres como Maia? Jô tentava não pensar nisso, mas, quando a questão surgia em seu cérebro, convencia-se de que sim. Ele devia ir a boates escusas. Preferia não saber sobre sua vida sexual. Desde que ele tomasse cuidados, evidentemente.
E ela?…Bem, agora ela estava livre, pelo menos por enquanto, durante a sua aventura na estrada. Podia fazer o que quisesse, como quisesse, quando quisesse. Estava sozinha e livre. Mas aquilo que lhe propunha Maia…Talvez fosse demais. Porque certas fantasias se perdem, se são realizadas. Certas fantasias só são excitantes enquanto são fantasias. Se deixam de ser fantasias podem profanar quem as realiza. Jô não queria cruzar certos limites. Não.
Não.
Ou será que deveria? Será que não era seguro? Maia garantia que sim. Ela permaneceria incógnita, num lugar desconhecido, de máscara, o que era ainda mais excitante. Será que deveria?
Jô pensava, pensava… Olhou para a amiga deitada ao lado dela, na rede. Respirou fundo.
— Maia… — disse afinal, e a outra se empertigou com alguma dificuldade. — Eu não vou ficar dez dias aqui.
— Por que não? — protestou Maia.
— Calma — tocou no ombro da loira. — Tenho que seguir minha viagem. Vou fiar mais um tempo, depois vou adiante. Mas tem uma coisa: vou passar por São Paulo.
Maia sorriu:
— Vai me visitar?
— Vou.
— Promete?
— Prometo.
— Ai, que maravilha! Aí você vai lá comigo. No meu…trabalho, digo.
— Não sei. Neste caso, não prometo nada. Vou pensar, está bem?
— Mas você vai ficar lá em casa comigo pelo menos alguns dias.
— Isso eu vou.
— Ah, então já está bom.
Maia ergueu o torso e beijou-a no rosto. Depois, aninhou-se contra seu corpo. Jô permitiu que ela se aconchegasse e, com o pé, impulsionou a rede de leve. Ficaram assim, quietas, em silêncio, embalando-se docemente, ouvindo o bramido do oceano, até que adormeceram.
Jô despertou com as primeiras luzes da manhã. Maia dormira com a cabeça recostada em seu peito, como ela, Jô, às vezes fazia com o marido Fábio. Afastou a cabeça loira da amiga com gentileza, cuidando para não acordá-la. Levantou-se da rede. Espreguiçou-se. Caminhou até a parte da frente da casa.
O mar imenso abria-se diante dela. Jô inalou o ar marinho com vontade. Levantou o queixo para o céu. Olhou para o sol que nascia no horizonte. Pôs os pés descalços na areia. Caminhou alguns metros em direção ao mar que quebrava na areia. A manhã estava quente fresca o mesmo tempo.
Então, fez algo que há muito tempo queria fazer, algo com que sonhava desde a adolescência. Tirou toda a roupa e entrou nua no oceano Atlântico. Pulou uma onda, outra e atirou-se n’água, enfim. Nadou gostosamente. Sentia-se feliz, feliz… Era livre como um bicho. Com um ser humano deve ser.
Nadava e boiava, sentia os raios do sol e a água acariciando seu corpo nu, e assim permaneceu durante algum tempo. Quanto, não se sabe. Meia hora, talvez? Uma? Quando decidiu sair do mar, a surpresa. Havia um homem parado na praia, de pé, próximo às suas roupas. O homem a observava, era evidente. Quanto tempo devia estar ali? Jô ficou parada, de pé na areia, a nudez coberta pelo mar, indecisa.
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