
O quadro de dona Diva Martinato, pintado por Aldo Locatelli em 1962, poucos meses antes de o pintor falecer. Foto: Guilherme Martinato, divulgação
Desde 1962, ano em que Aldo Locatelli faleceu, o óleo sobre tela de dona Diva Martinato, 87 anos, decora a sala do amplo apartamento da família. Foi lá que, durante dois dias de seu último ano de vida, o pintor italiano eternizou a esposa do empresário do ramo óptico Aldo Martinato (in memoriam).
Nesta terça, quando se celebra o centenário do artista, nascido em 18 de agosto de 1915, toda essa história ganha ares de ineditismo. Pela primeira vez, dona Diva recordou com precisão de detalhes a confecção da obra.
A tela foi pintada em momentos distintos: além dos dois dias na residência da família, Locatelli solicitou que sua modelo posasse durante mais dois no atelier localizado no bairro Petrópolis, em Porto Alegre, onde morava.
O figurino foi escolhido pela própria: um vestido de gala e um leque. Cabelo e maquiagem também ficaram a cargo da jovem senhora de 34 anos.
– Ele praticamente não falava, pintava em silêncio. Mas fumava demais, acendia um cigarro atrás do outro – recorda dona Diva.
Morte poucos meses depois
O quadro surgiu meio por acaso. Um amigo em comum apresentou os Aldos durante um encontro. Após o pedido de Martinato –“o senhor não gostaria de pintar minha esposa?” –, Locatelli imediatamente deu início aos trabalhos.
Finalizadas as quatro sessões, o artista teria ligado ao empresário avisando da necessidade de voltar a Caxias para dar os retoques finais na tela. Não deu tempo. Locatelli faleceu em 3 de setembro de 1962, em Porto Alegre, deixando dona Diva “inacabada”.
Apreciando-se hoje, porém, talvez pouca gente perceba a ausência dos retoques finais: o quadro é perfeito. Pela data, acredita-se também que a tela seja um dos derradeiros retratos particulares encomendados ao pintor.
Quem sabe até o último…

Quadro decora a sala do apartamento de dona Diva Martinato desde 1962. Foto: Guilherme Martinato, divulgação
Detalhes
As araucárias ao fundo do quadro provavelmente foram inspiradas pelo cenário caxiense: da janela da sala dos Martinato avista-se parte do Mato Sartori.

Em 1952: Elyr Ramos Rodrigues, diretora da antiga Escola de Belas Artes, também foi retratada por Aldo Locatelli. Foto: Roni Rigon, banco de dados/Pioneiro
Três mulheres
Retratos particulares produzidos ou encomendados em Caxias foram pouquíssimos na época em que Locatelli realizou obras pela cidade, entre 1951 e 1958.
Em óleos sobre tela também foram eternizadas Elyr Ramos Rodrigues (diretora da antiga Escola de Belas Artes, em 1952, foto acima) e a artista plástica Valdira Danckwardt – que, quando estudante, inspirou ainda um dos anjos das Obras de Misericórdia, nas laterais da Igreja São Pelegrino.
Como Locatelli faleceu antes de retornar à cidade para retocar a obra, o pagamento pelo quadro de dona Diva Martinato foi recebido posteriormente pela viúva do pintor, dona Mercedes Biancheri. O pintor morreu vitimado por um câncer, atribuído ao fumo e ao forte odor das tintas que inalava diariamente.
Aldo Locatelli tinha apenas 47 anos.
Elyr Ramos Rodrigues: um óleo sobre tela em 1952.
Obra derradeira
A última obra de Aldo Locatelli foi a pintura inacabada do Sagrado Coração de Jesus, à esquerda da nave da Igreja da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, em Porto Alegre.
Comentários