De um Delegado de Policia de Santa Catarina, devidamente identificado, mas mantido em reserva por motivos óbvios, sobre a situação da Policia Civil e da segurança pública, via e-mail:
“Prezado Moacir,
Escrevo em razão das repercussões dos recentes movimentos de policiais civis catarinenses, pleiteando melhoria em seus salários. Os vencimentos de agentes, escrivães e delegados da Polícia Civil catarinense são, notadamente, uns dos menores do Brasil. Esse fato é mascarado pelo governo estadual com a maquiagem de alguns abonos e outros penduricalhos, mas não modificam a situação de penúria a que estão submetidos os servidores públicos da segurança pública de SC (civis e militares).
O governo insiste em alardear notícias infundadas e falsas, para minimizar os impactos da completa falta de política de segurança no Estado, mas é cristalino o descompromisso do Estado com a segurança da população.
Santa Catarina não é um estado seguro! Não se investe em segurança, não se investe nos policiais, não se valoriza os policiais e, consequentemente, não se respeita a sociedade. O efetivo da PCSC é o mesmo (se não menor) desde 1984. Neste período a criminalidade aumentou em 180%. Os salários estão defasados, sem reajuste, incompatíveis com a reponsabilidade da função eo custo de vida. Ainda assim somos cobrados diarimente, por respostas que, muitas vezes, não temos condições de dar.
Segurança pública custa caro, sim. Mas é o preço que todos pagamos por não se ter, desde tempos passados, uma política séria neste setor. Para “arrumarmos a casa” são necessários investimentos, ou a situação só tende a piorar. Se o governo estadual não passar a se preocupar com a questão da segurança pública, certamente descambaremos para a total e real insegurança (já que a sensação já é de total insegurança).
Parece piada, mas o governo se preocupa apenas com imagem, e não com soluções de fato.
Para ilustrar, me escoro em situação ocorrida ontem em Balneário Piçarras, comarca da qual sou Delegado Titular da Delegacia de Polícia (apesar de afastado temporariamente por estar desenvolvendo trabalhos em outra região). Lá, ontem, tivemos uma situação de roubo a residência, com tomada de reféns. Cinco indíviduos armados tomaram como reféns um casal, trocaram tiros com a polícia e conseguiram fugir. Na fuga sequestraram outro homem e seu caro, abandonando-o horas depois. Crimes como esse tem se mostrado comuns na região, e apesar das inúmeras reclamações pela falta de estrutura e falta de policiais, nenhuma das solicitações por melhorias tem sido atendidas pela “cúpula”.
Mas, o que é pior, o Delegado de Polícia que me substitui durante o afstamento, apesar de contatos sucessivos, não conseguiu sequer obter apoio de outras unidades da Polícia Civil para responder ao ataque dos criminosos. Esse descaso culminou com a fuga dos ladrões. Os policiais não tinham equipamento adequado (sem coletes balísticos e armamento eficiente), e correram risco ao enfrentar a tiros os criminosos.
Contrastanto com esse desinteresse institucional, alguns dias atrás foi colocada uma faixa na Delegacia de Penha (que faz parte da Comarca de Piçarras) mencionando as dificuldades salariais (fato mencionado em seu blog). Rapidamente, em menos de 20 minutos, o helicóptero da PCSC foi ao local para “investigar” a manifestação e instruir o procedimento de corregedoria. Ou seja, para reprimir uma manifestação justa se desloca uma aeronave para fins meramente correicionais, mas para atender um assalto com reféns não se move uma palha.
Infelimente esse é o retrato da Polícia Civil catarinense, e esse é o tratamento que o policial merece do governo. O mesmo tratamento que retrata o descaso com a segurança da população.
Cordialmente, ..Delegado de Policia.”