
Mark Brown, The Guardian
Stephen Pax Leonard, 36 anos, em breve trocará gramados, livrarias e o primeiro time de professores da Universidade de Cambridge, na Grã-Bretanha, por três meses de escuridão, temperatura de até -40°C e caçadas a focas. Mas o pesquisador acadêmico, que deixou a Grã-Bretanha na metade deste mês, tem uma missão: aproveitar a última chance de documentar a linguagem e as tradições de uma cultura.
– Eu estou extremamente excitado, mas também apreensivo – afirmou Leonard, enquanto realizava os preparativos finais.
Leonard, um linguista antropólogo, vai passar um ano vivendo com os esquimós do noroeste da Groenlândia – os inughuit –, uma pequena comunidade cujos integrantes vivem uma rotina de caça e coleta similar a de seus ancestrais. Eles falam um dialeto, o inuktun, que nunca foi totalmente transcrito, e passam suas histórias e tradições de forma oral.
– As mudanças climáticas significam que restam a eles mais 10 ou 15 anos. Depois disso, terão de se mudar para o sul, e muitos, provavelmente, instalem-se em apartamentos modernos – disse Leonard.
Se isso acontecer, uma cultura e uma língua inteiras devem desaparecer. Não existe literatura esquimó escrita, mas um forte e “distinto patrimônio cultural imaterial”, de acordo com Leonard:
– Se a língua deles morrer, seu patrimônio e sua identidade morrerão com ela. O objetivo desse projeto é registrá-la e descrevê-la para, então, devolvê-la às comunidades, de forma que as futuras gerações possam usar e entender.
Em 12 de agosto, Leonard despediu-se da família e dos amigos. Em seguida, voou para Copenhague – “é o único lugar onde você pode comprar um dicionário gronelandês-dinamarquês” – e então para a Groenlândia. Serão outros dois voos internos para chegar ao principal assentamento inughuit em Qaanaaq, na costa noroeste do país, no norte da Baía de Baffin.
Lá, Leonard espera aprimorar suas habilidades linguísticas e construir contatos por sete ou oito meses antes de ir para o posto inughuit mais tradicional, em Siorapaluk. É onde fica o assentamento permanente mais setentrional do mundo, em que vivem cerca de 70 inughuit.
Será ali que Leonard espera ouvir a narração que está no cerne dessa cultura prestes a acabar.
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Foto: Nei Maldaner, Divulgação