Os fãs de uma boa história policial, daquelas com detetive particular problemático e um assassino à solta, com certeza vão gostar de O Chamado do Cuco — livro que chegou às listas de mais vendidos no ano passado não pela trama em si, mas pela revelação de que o autor, o desconhecido Robert Galbraith, era na verdade a famosa J.K. Rowling, da série Harry Potter. Feita a ressalva sobre o motivo do sucesso repentino e estrondoso da obra, é preciso dizer que a história é boa, muito boa, independentemente de saber ou não sua autoria (tanto que ela já havia tido ótimas críticas na Inglaterra antes de o nome por trás do pseudônimo ser revelado).
Pode-se dizer que a trama é clássica, com a inteligência do detetive como ponto central. Se Cormoran Strike não é tão durão como Sam Spade, excêntrico como Hercule Poirot, intelectual como Sherlock Holmes ou preguiçoso como Nero Wolfe, tem em comum com eles a absoluta vocação para a investigação. Investigar é tudo que ele sempre quis, mesmo antes de abandonar a universidade e se juntar à polícia militar — de onde só saiu após perder a perna direita na explosão de uma mina no Afeganistão.
Agora como detetive particular (e com uma perna mecânica que ele teima em esconder), suas principais tarefas são seguir maridos e esposas para ver se são ou não fiéis. Nada com o glamour ou a emoção que sua nova secretária, Robin, imaginava que iria encontrar num escritório de detetive. Mas justamente quando Strike está em seu pior momento, afundado em dívidas e morando no escritório desde que rompeu com a noiva, aparece um novo cliente.
John Bristow, irmão de um antigo colega de escola, quer que Strike investigue a morte de sua irmã, a supermodelo Lula Landry, conhecida pelos amigos como Cuco (embora, curiosamente, ela só apareça com esse nome umas poucas vezes no decorrer das páginas). Lula morreu três meses antes, ao cair de seu luxuoso apartamento de terceiro andar, no que, segundo a polícia e os jornais, foi um suicídio.
Embora a modelo tivesse histórico de drogas e problemas psicológicos, além de ter brigado publicamente com o namorado horas antes da morte, Bristow insiste que ela não se suicidou, mas foi assassinada. Como prova, ele aponta as imagens granuladas de uma câmera de rua, que mostram um homem se aproximando do prédio pouco antes, e correndo para longe pouco depois da queda. Além disso, uma testemunha teria ouvido a moça discutindo com um homem segundos antes da queda, mas acabou desacreditada pela polícia.
Inicialmente, o detetive tenta recusar o caso, pois duvida que a polícia tenha ignorado evidências numa morte de tanta repercussão. Depois, acaba aceitando, decidido a fazer um bom trabalho, mesmo que seja para provar que Cuco realmente se jogou. Nas semanas seguintes, ele conversa com amigos e conhecidos de Lula, que incluem outra modelo e um estilista, além de uma sem-teto, indo do mundo das celebridades ao mundo de origem da garota, filha de uma mãe solteira e adotada pela família rica Bristow.
Aos poucos, Strike se convence de que houve mesmo um assassinato, embora a maioria dos conhecidos de Lula (e a polícia) ainda insista em dizer que só pode ter sido suicídio. Nem todos, porém, falam a verdade, e aquilo que o leitor pode tomar como certo, apontando para um ou outro suspeito, no final pode se revelar uma mentira.
Ao final, além de se surpreender com as revelações e deduções do detetive-protagonista, o leitor ainda é presenteado com a expectativa de que, futuramente, novos livros com Cormoran Strike (e Robin) deverão vir. E com a constatação de que J.K. Rowling, decididamente, não é escritora de um gênero só — e agora está muito mais madura do que quando lançou Morte Súbita, seu primeiro romance adulto, dois anos atrás.
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Ah: no Brasil, O Chamado do Cuco tem edição da Rocco, 448 páginas e opções do livro encadernado por R$ 49,50, em brochura por R$ 39,50 ou no formato digital por R$ 27,50 (em alguns sites, tem desconto).