Cada vez que um médico inventa uma interdição, tremo nas bases: todo um universo é amputado, uma dimensão suprimida. E a sensação de inadequação se amplia.
Primeiro foi o leite. Diz que não o digerimos bem. Passei a tomar apenas café preto. Mas pode haver leite até no purê de batatas! O grande drama, contudo, seguem sendo os queijos: como viver sem queijo? Queijo, pão e vinho são os alicerces da felicidade!
Depois veio essa história do açúcar. Fala-se em síndrome metabólica, incapacidade das células em metabolizar o açúcar, reações alérgicas monstruosas, inflamações no sangue com zilhões de efeitos colaterais altamente perversos! Um pesadelo! Lá se foram quindins, chocolates, tortas….ahhhh, os doces de Pelotas!!! Como viver sem um pastel de santa clara?
Mas isso não é nada. Se o açúcar integrar a sua listinha negra de interdições, prepare-se para investir horas e horas nos corredores dos supermercados, com uma lupa na mão, lendo as letrinhas miúdas com a relação dos ingredientes nas embalagens. Há açúcar nos sucos, nos pães, nas massas, nas bolachas salgadas, nas barrinhas de cereal integrais, nas granolas, na erva mate, nos molhos salgados… E os japoneses metem açúcar no sushi. E as donas de casa polvilham seus bifes na chapa com açúcar, para dourar a carne… E em Santa Catarina o pessoal passa o café já com a água adoçada. E, e, e, e… Sem falar na Gol, que só serve porcariazinhas edulcoradas em seus vôos, como que dizendo: diabéticos e metabólicos deficientes – danem-se! E por aí vai…
Agora, médicos homeopatas entram numas que certas substâncias inibem ou bloqueiam os benefícios do tratamento: Citronela, eucaliptol, cânfora, hortelã e menta são os vilões da vez. Diz que é terrível! Basta uma balinha de menta para liquidar a eficácia de um tratamento homeopático! Tudo bem até: um sujeito pode passar sem citronela e sem eucaliptol. A cânfora já é mais complicado, sobretudo para o pobre coitado açoitado por dores no pescoço ou nas costas. Mas vá lá. Só que a menta, meu amigo, nem queira saber. Metem menta em absolutamente tudo! Balinhas sem açúcar, pastas de dentes, enxaguadores bucais, fios dentais… O pior, é que mentem sobre meter menta. Siiiimmmmm! Farmacêuticos e dentistas são frequentemente induzidos ao erro por marcas famosas, que acham despiciendo informar sobre a presença da menta nas embalagens dos produtos. Você pergunta: “por favor, me indique uma pasta de dentes sem menta”. E lá vão eles ler bulas. Depois de um bom tempo lendo letrinhas miúdas, voltam felizes com uma dúzia de produtos sem menta. Prove-os e você sentirá a menta.
Vem, então, a romaria de ligar para os serviços de atendimento ao consumidor. A Sensodyne é civilizada: tem um 0800 que atende imediatamente, não enchem o saco pedindo um monte de informações suas e vão logo admitindo que colocam menta em absolutamente tudo o que produzem. Já a Colgate, é chocante: o 0800 não completa a ligação. No site, o gentil “fale conosco” é um truque para colher seus dados pessoais. Para saber se tem menta nos produtos deles, só falta exigirem que você informe a cor das cuecas que está usando! Depois de disporem do seu tempo, exigindo que você preencha o cadastro deles para colher as suas informações pessoais, que sabe lá como serão usadas pela política de marketing da empresa, informam que, na melhor das hipóteses, responderão a sua pergunta em 48 horas. Então, se você está para começar um tratamento homeopático, mesmo que seja questão de vida ou morte, terá de esperar para que a Colgate se agilize.
Ao fim e ao cabo, no melhor dos mundos, você descobrirá que só não tem mesmo menta nos produtos infantis de higiene bucal, e olhe lá, só estão livres dela os tutti-frutti, porque os de sabor uva, estão batizados! Argh! Até nem sei como não apareceu por aí um espertinho para arrancar um troco por indenização desse pessoal que não informa sobre a menta nas embalagens. Se fosse nos Estados Unidos, já tinha rolado processo… Quanto ao paciente em tratamento homeopático, está condenado sem dó nem piedade às pastas de dentes infantis sabor tutti-frutti. Uma amputação pior, muito pior, do que a interdição de acesso aos doces pelotenses…