Falar sobre o 4-3-3 do Chelsea e do Santos suscitou um grande debate via Twitter, com diversos amigos – principalmente o Carlos Pizzatto, do Blog do Carlão. E como o assunto é interessante, resolvi dissecar a minha linha de raciocínio em um post, sempre respeitando quem pensa de maneira diferente, e sem me colocar como o proprietário de uma verdade que não existe. Afinal, neste tipo de análise a semelhança ou a diferença entre percepções é extremamente tênue.
No futebol, pela teoria, existem três tipos de táticas. A tática coletiva – ou sistema tático – que representamos pelos numerozinhos (4-4-2, 4-3-3, etc…); a tática de grupo, que envolve jogadores aproximados em setores (defesa, meio-campo, ataque, triangulações por setor, cobertura em sistemas de marcação, etc…) e a tática individual – a função que cada jogador cumpre dentro das táticas de grupo e da tática coletiva.
Na tática individual, é preciso levar em consideração o que é atribuição desta função específica com a bola e sem a bola. Para mim, uma equipe só apresenta variação tática quando um mesmo jogador cumpre duas funções (táticas individuais) diferentes. Do contrário, não há variação de sistema se um jogador desenvolve vários movimentos – mesmo que complexos – que fazem parte de uma única tática individual.
Exemplo: em dezembro, a TVCOM reprisou a íntegra do jogo Grêmio x Hamburgo, comemorando os 25 anos da final do Mundial. Eu parei para assistir. O Tricolor de Valdir Espinosa jogava no 4-3-3, com Renato na direita, Caju (depois Caio) na esquerda e Tarciso centralizado. Com a bola, Renato abria para receber ao lado da área; e sem a bola, ele acompanhava o lateral do Hamburgo. E não foram poucas as vezes que Portaluppi foi visto na bandeirinha de escanteio defensiva dando carrinho para bloquear o jogador alemão.
Isto significa que o Grêmio variou taticamente do 4-3-3 para o 4-4-2, ou para o 4-5-1, só porque os pontas marcavam os laterais do Hamburgo? Não. Marcar é uma das atribuições da tática individual do ponta. Foi 4-3-3 do início ao fim. Estar no campo de defesa auxiliando Paulo Roberto não fazia de Renato um meio-campista, ala, ou volante. Ele seguia um ponta-direita. Cumprindo uma de suas atribuições: marcar sem a bola, jogar com ela.
Hoje, diversas equipes jogam no 4-3-3. Na Europa, claramente o Chelsea e o Barcelona. No time inglês, com Malouda e Anelka (ou Kalou) pelos lados; e no Catalão, com Henry e Messi. Não raro vemos Anelka cobrindo Ivanovic, e Malouda auxiliando Ashley Cole. Fazem o mesmo no Barça o Messi em socorro a Daniel Alves, e Henry com Abidal.
No sistema tático 4-3-3, mesmo que os atacantes pelos lados não sejam “pontas”, mas sim os chamados “second top`s” (algo como “segundo atacante”, o jogador de movimentação) faz parte da sua tática individual, dentro das táticas de grupo e coletiva, marcar o lateral adversário. Geralmente, a marcação escolhida é mista: por zona na defesa e no meio-campo, centroavante em meia-pressão ou pressão na saída de bola, e por função pelos lados – atacantes pegam laterais, individualmente. Não há variação para o 4-5-1, portanto. É um movimento natural.
Vejo semelhanças no caso do Santos, que analisei ontem. Neymar e Madson são atacantes pelos lados. Jogam à frente do articulador Paulo Henrique, abertos e verticais – estão a poucos passos da área, e todas as jogadas que promovem não são de organização, mas sim de preparação para a finalização. Eles não pensam o jogo, mas sim encaminham a conclusão de jogadas. Mas sem a bola, combatem os laterais – principalmente em pressão, ou pressão alta, na saída de bola. Não vejo variação tática, portanto. Para mim, é 4-3-3.
Outro ponto importante para mim neste debate: sou muito resistente – e só uso a pedido de alguns leitores – a descrições táticas com quatro números. Afinal, o campo só tem três setores: defesa, meio e ataque. Para mim, dizer que o Arsenal joga no 4-2-3-1 confunde – e quando faço isso, é para evitar polêmicas e agradar ao paladar da maioria. Prefiro dizer que o Arsenal joga no 4-5-1, com dois volantes e três meias.
E por aí vai: não gostaria de dizer que o Brasil tetracampeão jogou no 4-2-2-2, mas sim no 4-4-2 com meio-campo em quadrado; Senão, nos veríamos obrigados a dizer que o Inter do Tite joga no 4-1-2-1-2. Horrível, né? Para mim, é o velho e bom 4-4-2 com meio-campo em losango. Acho melhor descrever um sistema tático pelos três setores, e desdobrar a análise textualmente com o desenho do meio-campo.
Muita numeração para caracterizar o sistema tático complica demais, e é um modernismo que acredito desnecessário. Além de prejudicar a análise do todo, pois acabamos percebendo variações demais quando na verdade os jogadores não deixaram de cumprir suas atribuições naturais, nem saíram de seus setores de origem. Não sei quem inventou isso, mas não concordo. Respeito quem pensa diferente. O debate está aberto…
Postado por Eduardo Cecconi