Com a correria para cumprir o prazo da série diária de posts sobre as 32 seleções da Copa do Mundo da África do Sul, consigo apenas agora recuperar um assunto muito importante para os torcedores do Inter. Jorge Fossati deixou o clube há mais de uma semana, ainda não há um substituto definido, e a diretoria abriu um debate ao declarar quase consensualmente que o elenco havia sido estruturado para o 4-4-2, apesar da predileção do ex-técnico pelas formações com três zagueiros.
A dispensa de Fossati suscita dois debates de igual valor: resultado x desempenho, e convicção x adaptação. Era evidente que o Inter deveria jogar no 4-4-2 – sistema que proporcionava melhor desempenho, mas Fossati obtinha resultados no 3-5-2/3-6-1; ou seja, ao invés de se adaptar às características do grupo, preferiu impôr uma convicção tática. Seria este um duplo erro? Abdicar do bom desempenho e forçar uma estrutura tática indesejada pelos próprios jogadores?
Fossati acha que não. Na última sexta-feira, ele lembrou que o objetivo do clube foi alcançado: chegou à semifinal da Copa Libertadores. Obteve resultados com convicção tática, embora sem desempenho, e sem se adaptar às características dos jogadores. Ainda assim foi dispensado. Uma demonstração de que, para os dirigentes, o resultado alheio ao desempenho não inspira confiança. Afinal, da maneira como o Inter de Fossati vinha atuando (mau desempenho provocado pelo sistema tático), o abandono dos resultados parecia iminente se nada fosse alterado. E Fossati não iria alterar sua ideia de jogo.
Este aspecto é importante no discurso de Fossati: a ideia de jogo. Ele diz que, acima do sistema tático, o mais importante é a ideia. E qual a ideia – traduzo por “estratégia” – Fossati prefere? Linhas recuadas, comportamento reativo, concessão da posse de bola ao adversário, aposta no bloqueio defensivo, e transição ofensiva veloz. Prioritariamente não sofrer gols; logo abaixo, impedir o adversário de jogar; feito isso, o terceiro passo é atacar sem se desorganizar; e somente com todos os passos anteriores assegurados, buscar a marcação de um gol. Uma tradução popularesca seria algo do tipo “dane-se o desempenho, eu quero é ganhar”. Pouco, acredito, para um grupo com qualidade de sobra no meio-campo, capaz de produzir uma equipe mais equilibrada, menos reativa. Capaz de aliar bom desempenho ao resultado.
Para encerrar, reproduzo uma conversa que tive com repórter de rádio daqui de Porto Alegre. Ele, fã do futebol espanhol. Eu, crítico do campeonato nacional da Espanha, recheado de equipes médias, e partidas sonolentas. O argumento dele é “o futebol espanhol é vencedor”. Este é o raciocínio: se venceu, tem bom futebol. Se perdeu, automaticamente, é ruim.
Prefiro – sem considerar o colega equivocado em seu pensamento – priorizar o desempenho nas minhas análises, e nas minhas predileções. Sem desconsiderar o resultado, é lógico. A diferença para mim fundamental é esta: sou jornalista. Quando assisto a um jogo (qualquer jogo) não estou torcendo nem por A, nem por B. Estou analisando desempenhos. Quem depende do resultado? Treinador, jogadores e diretoria. E quem exige resultado? A torcida. O analista tático pode prescindir destas obrigações, e assumir uma “irresponsabilidade” no sentido de não ser responsável pelo resultado.
Quero, concluo, assistir a bons jogos. Priorizar a análise do desempenho. Do bom jogo, do bom futebol. É claro, reconhecer quando um time vence sem bom desempenho. Reconhecer que alcançou seu objetivo, mas que isto não o imuniza da crítica pelo mau futebol. É o que pode ser dito de Jorge Fossati no Inter: alcançou o resultado desejado sem bom desempenho. Concedo-me o luxo desta licença poética, de achar que apenas resultado não é suficiente, de acreditar que o Inter poderia jogar – e pode jogar – muito melhor, sem deixar de conquistar as mesmas coisas.