BARULHINHO BOM
Existe um som moderno que ecoa de um casarão dos altos da Rua Coronel Flores, em Caxias do Sul, e que intensifica a movimentação nos entornos do Largo da Estação Férrea. Trata-se da Level Cult, endereço dos mais conectados, alternativos e prestigiados da noite caxiense. Capitaneado por dois empreendedores muito sintonizados, César Alexandre Casara e Lídia Ribeiro, o espaço foi transformado em referência tanto pelo ecletismo de sua música quanto pela performance de seus frequentadores. Lídia estudou Comunicação, viveu por um ano na Nova Zelândia e trouxe na bagagem o talento para a produção artística das animadas noites que comanda.Graduado em Publicidade e especializado em Design, Casara fica nos bastidores e cuida das funções administrativas da casa. Porém, revelase como o pianista e virtuose que compõe o Yangos Quarteto Instrumental. Da simbiose da dupla, que trabalha unida desde 2010, nasceu o point multicultural que agrega diferentes formas de expressão artística, entre exposições, pequenos festivais e as badaladas festas que vão do pop ao indie, do rock ao funk.

Quem é quem:
Lídia Ribeiro já sabia desde cedo que seu futuro profissional seria na comunicação e passou a trilhar seu caminho para este objetivo. Acredita que o poder cognitivo de absorver informações e transformá-las em coisas concretas vem dos estímulos criativos que sua mãe e irmã disponibilizavam quando criança e adolescente, como leituras diversas que exercitavam a imaginação e brincadeiras de raciocínio. Possui acesso à evolução do design gráfico e suas ferramentas desde quando era adolescente na serigrafia de seu irmão mais velho onde trabalhou por 10 anos desenvolvendo layout dos mais variados tipos para os mais diversificados clientes. Com 26 anos morou na Nova Zelândia por um ano e quando voltou montou sua primeira agência de publicidade. Foi editora e redatora de uma revista local sobre cultura e comportamento e hoje administra e produz a Level Cult junto com Cesar Casara e é diretora de arte e sócia da agência de design Sótão Design e Comunicação.
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César Alexandre Casara respira música desde seus primeiros passos e sempre teve sua vida pautada pela arte, sendo a música o elo de tudo o que já produziu. Como músico, participou de diversas bandas importantes do cenário musical gaúcho, como a Lucille Band de Caxias do Sul e a banda Dublê, de Porto Alegre. César, além da Level, possui o estúdio de gravação AltaVoz, onde também produz diversas bandas da região, e é pianista do Yangos Quarteto Instrumental, com quem até hoje podemos vê-lo pelos palcos de toda região. Publicitário de formação, graduou-se pela Unisinos em São Leopoldo e, amante da arte, fez pós em Design Gráfico na mesma universidade. Empreendedor desde a juventude, aos 16 anos já viajava pelo estado vendendo shows das primeiras bandas onde atuava como tecladista. Produziu, gravou e participou de mais de 50 CDs, perdendo a conta de quantos shows. Tocou com todos os grandes nomes da cena musical caxiense de sua geração, participando ativamente do movimento artístico da cidade.
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Quando e como surgiu esta parceria profissional?
Nós nos conhecemos em 2010, quando a Lídia começou a produzir algumas festas em um dos bares dos quais eu era sócio. A química fluiu tão bem que logo a empresa de comunicação na qual ela era sócia começou a fazer assessoria de imprensa para o Quarteto Yangos. Entre uma balada e outra, entre um acorde e um rabisco, começou a se desenhar a ideia de um novo bar, com um novo conceito, diferente de todos em nossa região. Foi então que com um joelho no chão e anel na mão, apresentei a proposta pra Lídia, que topou na hora… Nove meses depois, nascia o ou a (a orientação sexual quem decide não são os pais mesmo) Level Cult.
Como é o dia a dia de trabalho de vocês e como dividem suas funções?
Cada fim de semana é um novo desafio e para a produção de cada festa são analisados diversos fatores, como público alvo, o que está em alta no momento, quais as preferências do público, ambientação, e, em cima disso, sempre tentamos ousar. Às vezes funciona, em outros momentos não dá certo, mas entre erros e acertos vamos moldando cada festa para que agrade e faça todos se divertirem. Para que a Level funcione nas sextas e sábados é preciso que desde a segunda-feira sejam planejados todos os detalhes do fim de semana a seguir. Como a Sótão Design tem sua sede no sótão do casarão da Level, o funcionamento é em horário comercial de segunda a sexta. O movimento é intenso, a campainha e o telefone nunca param e as explosões de ideias são constantes, desde as mais absurdas como as mais funcionais.
Falem sobre a ideia original da Level Cult: como o espaço surgiu, sua proposta original, seu público de interesse?
A ideia inicial da Level foi fundamentada em um espaço multicultural que pudesse agregar diferentes formas de expressão artísticas, desde exposições como pequenos festivais e festas de música eletrônica. Com o passar do tempo a casa foi se moldando, destacando-se entre as noites que atraiam mais público, as festas temáticas com dee jays. Nunca deixou de se investir em eventos culturais, sendo que sua frequência é determinada pelo interesse que o público em geral desperta para com os mesmos. Desde o início temos o foco em pessoas com mente aberta, livres de preconceitos, que respeitem o próximo da forma como escolheram ser, pois no final o objetivo é sempre o mesmo para todos: diversão!
Como é a relação de vocês com o público que frequenta a Level?
Sempre comentamos que nosso público é muito educado, cortês e é difícil ver alguma confusão dentro da casa. Desde o início a relação com os frequentadores sempre foi de uma forma muito transparente. A grande maioria acabara efetivamente se tornando nossos amigos. Quando você gosta de frequentar um ambiente e se sente bem, você acaba cuidando dele, como se fosse de fato a sua casa. Muitas vezes nos deparamos com clientes tão identificados com o ambiente descontraído de trabalho que participam espontaneamente da rotina de organização da casa, durante e após a festa, avisando sobre eventuais problemas e em muitas situações, auxiliando no bom andamento da noite. Assim acabamos criando um carinho mútuo.
E como conseguem agradar as diferentes tribos que frequentam o espaço?
Como o objetivo da Level sempre foi de manter um espaço democrático e de bom convívio, acabam por dividir o mesmo ambiente diferentes estilos de indivíduos. Para nós não importa sua estatura, peso, sua cor, orientação sexual, sobrenome ou onde você compra suas roupas. O que importa é você se sentir bem, se divertir ao extremo sem precisar vestir máscaras ou interpretar personagens para poder dançar até a exaustão.

Como a música está inserida na vida e cotidiano de vocês?
César: A música mistura-se comigo em tudo o que faço. Pode ser em preto e branco, atrás das teclas de um piano, ou ondulada, nos gráficos desenhados no computador do estúdio. Em alguns momentos barulhenta numa batida contagiante em uma festa, em outros, delicada, nos acordes de uma melodia instrumental. Pode ser gaudéria, pop, rock, eletrônica, acústica, cantada, gritada, instrumental… Ela faz parte de 100% do meu dia.
Lídia: A música sempre foi fonte de inspiração para qualquer processo criativo, e quando preciso de muita concentração é imprescindível o uso de meus fones com alguma música ensurdecedora nos ouvidos. Sou daquelas que escuta a mesma música até enjoar e é certo que ficarei surda em breve (risos)!
Como avaliam a cultura caxiense, em termos de opções culturais e de entretenimento?
Para nós, Caxias do Sul está no meio de uma transformação cultural e isso inclui também atitudes, forma de pensar e ver a cultura, formas de investir e também ter retorno com isso. A cidade cresce velozmente e é impossível frear o ímpeto das pessoas em busca de novos. Antes, para lotar um teatro, era preciso trazer algum ator global, de preferência bonito, da novela das oito, não importando se ele era bom ator. Hoje, já é possível ficar de fora de um espetáculo do Caxias em Cena, por exemplo, pois está lotado. Isso é lindo! Quanto ao entretenimento ainda é preciso amadurecimento, tanto da população quanto do poder público. O modelo adotado por grande parcela de nossa cidade por vezes dificulta a abertura de novos pontos culturais, refletindo diretamente na maneira como consumimos diversão. Dificulta-se assim a criação de uma cadeia artística que fortaleça o valor comercial da produção cultural como um todo. Ainda é preciso melhorar muito, incentivar cantores, escritores, artistas plásticos, estabelecimentos… De qualquer maneira, este é um problema de nossa sociedade não apenas em nossa cidade. Não adianta só ficarmos reclamando, todas as cidades possuem suas dificuldades, mas é preciso acreditar e fazer.
E quanto ao público caxiense da cultura, como o definem?
Como Caxias do Sul tem enraizado a cultura do trabalho pesado, árduo e diário, essa válvula de escape do entretenimento acaba sendo lazer. A busca pela cultura tem que se tornar um hábito como ir para a academia e passear pelos corredores dos shoppings nos domingos. Existem muitos consumidores de cultura em Caxias, muitos incentivadores, aqueles que estão em todos os eventos, sejam grandes ou pequenos, e também já existem muitas pessoas sobrevivendo de seu produto cultural. Para Caxias do Sul isso é uma grande evolução. Também é preciso parar de criticar de forma negativa. Não estamos dizendo para você montar uma banda ou escrever um livro, mas que prestigie eventos culturais bacanas e acessíveis que ocorrem em diversos lugares da cidade, sejam os Tons da Estação na Level, os encontros literários que o grupo Nós Sem Hora realiza na Do Arco da Velha Livraria e Café, as exposições das galerias da cidade (sim, elas existem!), os filmes alternativos da Sala de Cinema Ulysses Geremia, no Centro de Cultura Ordovás, e por aí vai… Basta se informar!
Quais são os planos para 2014 em termos pessoais e profissionais?
Estamos sempre planejando alguma coisa nova, das mais “absurdas”, como abrir uma filial da Level na Groelândia ou como largar tudo e fazer trabalho voluntário pelo mundo. Como se fossemos motivados pela vontade de inovar e evoluir pessoalmente. Não podemos ainda dar certeza absoluta do que virá por aí, mas uma coisa é certa, virão coisas boas e quem curte a Level vai gostar!

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