Planejamos a nossa viagem com uma lembrança sempre presente , as cenas do livro “Os Catadores de Conchas” da doce Rosamund Pilcher que de uma forma lírica , marcou o imaginário mundial com a paisagem da Cornualha.
A Cornualha é uma região que por vezes pode ser inóspita , onde o vento e a chuva fina castigam os moradores em quase a totalidade do ano . Programar uma viagem para lá em pleno verão não é nenhuma garantia de bom tempo e praias ensolaradas e em nosso caso não fugimos muito à regra. São falésia a pique sobre o mar, sem um mirador preparado para rasgar o infinito nem sequer um posto de turismo com os souvenirs da ocasião, apenas um acidentado relevo lacônico e definitivo, o litoral.
Mas por outro lado , em tempos de atrações turísticas lotadas e ambientes atopetados , a região não pode ser mais aprazível! Vastas planícies verdejantes com pastagens repletas de cordeiros no interior e um litoral recortado por penhascos onde a amplitude , e até um certo desolamento, criam um ambiente arrebatador. Durante muito tempo nossos únicos companheiros de viagem foram alguns solitários que faziam as trilhas caminhando com cajados , como se estivessem em uma peregrinação religiosa.
Montamos nosso roteiro partindo de Barnstaple, onde alugamos o carro. Nosso primeiro destino foi Clovelly onde o tempo parou e a cidade , propriedade particular , cobra a entrada de forasteiros como se fosse a sala de visitas de de um nobre morador.
Fechada ao acesso de carros, tem as ruas pavimentadas por pedras e o acesso ao porto pode ser feito em lombo de burro. Somente 400 pessoas ainda vivem por lá e as casas são conservadas como um pequeno museu a céu aberto.
Acredito que os lugares têm alma, uma reverberação que derrama para as pessoas que os habitam. Ou será o contrário? Serão as pessoas que emprestam aos lugares a sua essência? Será a luz, a brisa, a o ar salgado e as colinas sinuosas que fazem acolhedores os habitantes da Cornualha? Ou é a serenidade de uma vida em comunhão com a natureza que eles trazem dentro si que nos sugere que a Cornualha é um lugar feliz? Pouco importa qual das duas possibilidades estão corretas, se titubear, ambas.
Nosso próximo destino foi Boscastle, um pequeno porto que oferece belas trilhas de caminhadas. Desde de Barnstaple até aqui são apenas 50km , o que dá a ideia de que as dstâncias não são grandes mas as estradas são muito estreitas e a direção na mão contrária, portanto vá com calma! Aqui muitas referências a tradição exotérica da região , bruxas gnomos e outros seres fazem parte da mitologia celta. Mergulhamos nas histórias e quase embarcamos em uma vassoura.
Viajar por muito tempo tem esta consequência: adquire-se um certo relativismo. Fica difícil aceitar os dogmas próprios como verdades absolutas. Visitamos outros países e ficamos sabendo que os nossos dogmas e mitos valem tanto como os deles.
Tintagel
Tintagel , o famoso castelo das lendas arturianas fica logo a seguir. Sua lenda começa a tomar corpo no século 12, quando Geoffrey de Monmouth conta a mítica história britânica, e descreve-o como o lugar da concepção de Arthur. De acordo com Geoffrey, Igraine, era a esposa de Gorlois, o Duque da Cornualha. Igraine, irmã de Viviane, deu à luz Morgana quando era esposa de Gorlois. Três anos depois, sua irmã Viviane e O Mago Merlim lhe incubiram de gerar o Grande Rei que unificaria as duas Bretanhas, com Uther. Uther, o Pendragon, apaixonou-se por Igraine e graças à feitiçaria de Merlim conseguiu assumir a forma de Gorlois e possuir sua esposa. Desta união nasceu Artur, o Grande Rei, em Tintagel.
Port Isaac é uma outra alternativa para um passeio gostoso e acolhedor. A vila já foi usada como set em diversos filmes como o engraçadíssimo ” O Barato de Grace” de 2000. Em 2005 foi cenário de uma montagem para a tv do nosso conhecido “Catadores de Conchas ” mas que infelizmente nunca vi por aqui.
Solidão , enquanto uns sentem as paisagens da cornualha como um desafio da natureza , para mim o arrebatamento de trilhas íngremes permitem uma viagem interior e um encontro com o âmbito mais profundo do meu ser. O vento salga a alma e endurece o dia a dia, mas tudo emana paz em sua profunda simbiose com o céu e o mar profundo.
Seguimos para mais um destino traçado no roteiro, desta vez a praia mais popular e charmosa do norte, St Yves. Chegamos ao entardecer e o sol tingia de dourado a baía que vista de nosso hotel nos chamava para uma primeira descoberta.
Tudo perfeito , uma típica cidade de veraneio inglesa com lojinhas e restaurantes em profusão , tudo decorado com muitos faróis e tecidos listados em azul e branco.
Depois de um jantar especial a beira a mar o maior espetáculo da viagem , a lua nasceu no horizonte, majestosa e imponente por entre os barcos , fantasgoricamente encalhados nas areias da maré baixa.
Importa, sim, o que os lugares deixam em nós quando os atravessamos. Deixam uma consciência de termos sido tocados por eles e acabamos ganhando a perspetiva sobre a ampulheta da eternidade e sobre o grão de areia que é a nossa vida nela.
A costa sul fica para um próximo post!
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