Gostaria de repartir com você algumas percepções de viagem que obrigam a uma reflexão. A viagem foi feita há uns meses. Sempre que volto faço isso. Dou um tempo. É comum chegar-se embalado e, aí, cometer grandes erros.
A sensação que tivemos lá fora desta vez é a de que vivemos um momento histórico em nosso país. Um momento compartilhado por todos, de todas as raças e origens, de todos os extratos sociais – e que, em síntese, traduz a sensação de que não mais vivemos no país do futuro e estamos vivendo num grande Brasil do presente. Confesso que fiquei contente… muito contente… mas perplexo. Quando cheguei a Paris, estava fora do Patropi há mais de três semanas. Era demais para mim; não poderia ter mudado tanto. Isso me assustou, pois lia que somos um país como todos nós gostaríamos que fosse, mas havia saído do Brasil há tão poucos dias. Muito pouco para me fazer esquecer o Brasil real, o que vejo com meus próprios olhos e aquele que me mostram os noticiários da noite e os jornais impressos que leio diariamente. Em contato com meus amigos do ramo, fico sabendo que o efeito é e foi provocado pelo puxa-saquismo de quem leio e gosto: o jornal Le Monde, jornal que, como disse, gosto muito, mas em vermelho nas contas e à venda nos últimos anos. Pertence ao Grupo Dassault – o mesmo que quer vender os caças Rafale, e provavelmente já tenha vendido alguns submarinos, e pretende montar aqui os próximos.
Gostaria que o que publica o Le Monde saísse da oficialidade e lembrasse do que eu chamo de Brasil Real: da nossa saúde calamitosa, da nossa violência, da nossa corrupção, dos milhões sem esgotos e sem água encanada. Gostaria de saber o percentual que não tem vaso sanitário em casa (na Índia, são 54%). Aqui, nunca alguém publicou. Muito menos o de mortes.
Como está publicado pelo O Globo do dia 8 de dezembro, se não venderem para nós, fecham uma divisão. Se fabricaram 200 aviões para o exército francês, nunca venderam um só.