Caro Rafael,
Não sou tenor ou contratenor. Muito menos sou contra tenores. Para se ter uma ideia do custo deste “cavalo de Troia”, que seria um presente operístico do governador e do prefeito, incluindo a árvore que deixou Papai Noel vermelho de vergonha, R$ 4 milhões é o valor gasto no carnaval de Florianópolis – quatro vezes mais que o orçamento da Fundação Franklin Cascaes.
No aniversário da cidade, em 1996, uma multidão de pessoas ocupou as ruas do centro para ver e ouvir a apresentação da Ópera O Guarani, de Carlos Gomes, regida por Júlio Medaglia. Os prédios, sobrados, escritórios, bancos e repartições públicas, transformaram-se em camarotes. Até os troncos da velha figueira, na praça XV de Novembro, serviram para aconchegar pessoas. Lembro-me do olhar atento de pessoas muito simples, acotovelando-se para assistirem ao grande espetáculo. Este cenário foi a melhor resposta destruidora da opinião elitista de que povo não gosta de ópera. Tudo isto por R$ 100 mil. Após 13 anos, considerando o acumulado da inflação, ficaria em torno de R$ 235 mil.
Por solicitação do Fórum Cultural de Florianópolis, o deputado Padre Pedro Baldissera encaminhou um pedido de informação ao governador, para saber quanto efetivamente o governo gastou com o tenor italiano e de que Fundo partiu o recurso. Além disto, pedimos se a quantia é resultante de renúncia fiscal.
Um prefeito e um governador, numa ação de mecenato, nos presentearam com uma árvore que não acendeu e com um cantor que não cantou. Na ópera clássica e romântica, o tenor geralmente representa o herói, em disputa com o vilão. Nunca soube de alguma ópera em que o vilão fosse um homem dotado de espírito gentil e animador, tão comum entre os antigos mecenas. Afinal, o ritmo do drama heroico não suportaria uma vilania contraditória, assim tão generosa. O que sei, é que todo este enredo operístico, com toda certeza, termina em tragédia.
Muito obrigado.
Murilo Silva — Secretário do Fórum Cultural de Florianópolis