
O primeiro show da turnê de volta de Amy Winehouse, em Florianópolis, no sábado passado, foi esclarecedor: a soul woman mais rocker do mundo está cantando novamente. Após noites vexatórias na Europa e no Caribe, Amy provou que recuperou a voz – e que segue terrível, diga-se. Começou bem, esfriou, se perdeu, parou de cantar e depois encerrou a noite em alta, como no início.
Em uma apresentação de pouco mais de uma hora, a britânica mostrou seu timbre potente, rico e grave, calcado em emoção à flor da pele, como ocorre com verdadeiros artistas. Porém, escolheu um repertório irregular, no qual baladas muito intimistas abalaram sucessos inquestionáveis e colocaram em risco (mas não destruíram) o desempenho geral do espetáculo. Well, you know she’s no good…
Ao que parece, o set foi sendo definido aos poucos, em cima do palco, em conversas com músicos e backing vocals. O grupo foi moldando a noite ao sabor dos acontecimentos, sem roteiro determinado. Deixando de lado parte das músicas mais intensas do espectro ska de sua carreira, que seriam perfeitas para o encerramento de um festival como o Summer Soul, Amy pontuou a noite com canções românticas muito lentas (como Some unholy war e Love is a loosing game), que caberiam melhor em um show para poucos em algum cabaré enfumaçado regado a vodka. Um evento para cerca de 10 mil pessoas exige menos introspecção e mais vigor.
Seja como for, poucas coisas na música hoje são mais importantes do que ver Amy cantando ao vivo. Principalmente quando há uma trinca de abertura como Just friends, Back to black e Tears dry on their own. Em certo momento, Amy passou o comando para o backing Zalon cantar Everybody here wants you (de Jeff Buckley) e What’s a man going to do. Ficou acompanhando tudo sentada no tablado da bateria. Medo… Zalon cantaria mais alguma com sua incrível voz? Por sorte não. Amy retornou ao microfone. Rolou um cover de Boulevard of broken dreams, de Tony Bennett. Do disco Frank, ouvimos I heard love is blind. Finalizou com Rehab, I’m no good, Me and Mr. Jones, You’re wondering now e Valerie. Faltas graves? Pelo menos duas: Fuck Me Pumps e Little Rich Girl.
Amy não falou muito durante o show. Ela é assim. Não estava lá para animar plateia. Veio até o Brasil para cantar. E cantou só o que preferiu. Confirmou que faz o que quer quando quer. E o resto que se f***. Provou que é diva. E divas não falam. Cantam.

Janelle deu show
Janelle Monáe é uma menina maluquinha. Híbrido de James Brown, Grace Jones e Michael Jackson criança, a superativa e doce Janelle roubou a cena com uma força quase comparável à que Arcade Fire teve para destruir Strokes no show em Porto Alegre em 2005.
Elétrica, cantou com clareza as letras verborrágicas de suas canções. E cantou com os olhos, expressiva. Desempenhou coreografias pré-determinadas, mas também improvisou. Fez uma entrada teatral, dançou moonwalk (de Jackson), homenageou Brown cenograficamente e pintou um quadro durante a apresentação. E o mais incrível é que essa overdose cênica, que segue o padrão conceitual do disco The ArchAndroid, não ofuscou o poder da voz de Janelle, evidente em canções como Dance or die, Locke inside, Cold war e Tightrope.
Janelle veio ao país hypada, mas sob a sombra de Amy. Mesmo assim, mostrou que não temia o gigantismo da britânica, passando por cima da tarefa de show de abertura como um trator. Assim como Winehouse, não falou muito com o público. Bom, você sabe. As divas não falam, cantam.

Mayer Hawthorne quem?
Esse sim falou com o público. Muito. A toda hora. Foi correspondido em alguns momentos, mas a verdade é que pouca gente realmente sabia quem ele era.
E quem é Mayer? É um branquelo nerd e elegante de voz fraca que faz neo-soul com influências do pop, da Motown e do hip hop. Tipo um Rivers Cuomo soul. Gostosas, b-boys, skatistas e DJs se espalham pelos seus clipes. Covers de M.I.A. e Snoop Dogg são comuns em seus shows.
Em Floripa, ele revisitou Beautiful, do rapper norte-americano. De autoria própria, rolaram Easy lovin, Make her mine e as mais conhecidas Maybe so, maybe no e Just ain’t gonna work out, entre outras.
O show foi praticamente perfeito, apesar do pouco alcance da voz de Mayer ao vivo. Acompanhado por músicos de primeira, o cantor fez uma ótima apresentação para aquecer a plateia para o que viria depois.
No geral, o Summer Soul Festival teve boa escolha de artistas, grandes performances e a promessa de que Amy tenha inaugurado uma nova fase musical – o que não significa uma nova personalidade.