O Gre-Nal, mais uma vez, confirmou a falta de fidalguia e boa educação de torcedores que vão aos estádios dispostos a qualquer coisa, menos assistir futebol e incentivar o seu time. A seguir, uma proposta inédita para salvar o maior clássico do futebol gaúcho:
Grenal, patrimônio de todos
*Ben-Hur Rava
O Gre-Nal é mais do que um jogo de futebol entre dois times rivais no Estado. Há muito transcendeu a mera peleia futebolística aqui nos pampas entre azuis e vermelhos, tornando-se uma espécie de marco histórico, cultural e tradição que acompanha indivíduos, famílias e grupos. Chegam os mais exaltados seguidores daquelas cores a intitularem-se uma “nação”.
Pois bem, o que caracteriza um povo como “nação”, entre outros fatores, é o grau de civilização que alcança e o diferencia da mera etapa de barbárie. E isso parece estar se perdendo com relação ao Gre-Nal, por ação daqueles que o freqüentam.
Não faz muito tempo, Gre-Nal era sinônimo de sociabilidade, de diferença demarcada entre crenças ancestrais. Não se vira gremista ou colorado; se nasce assim. É quase uma decorrência das nossas lutas políticas: a demarcação bem definida daquilo que somos e do que queremos.
Atualmente, no entanto, este espírito combativo, mas fidalgo, desapareceu do Olímpico e do Beira-Rio. O que se vê é sempre a mesma coisa: tumulto, violência e insegurança. Hordas de baderneiros, homiziados em “torcidas organizadas” ou em bandos de delinqüentes aproveitam o “clássico” Gre-Nal para propósitos que servem à violência, à agressão e à canalhice da corja que se esconde no anonimato da multidão.
Isso faz com que seja cada vez mais difícil uma ação dos órgãos de segurança privada e pública, em controlar, prevenir ou reprimir tais ações.
A própria beleza das cores antagônicas nos estádios, que coloria o espetáculo e trazia vibração, hoje se esmaece pela imposição do interesse do mandante em seu campo, para satisfazer um número de sócios, cada vez maior. É triste, e ao mesmo tempo grotesco, que num jogo de futebol que se insere na história da cidade, do Estado e do país, não haja mais espaço para a civilidade e reste a barbárie.
Se o Brasil é o país do futebol — que está introjetado em nossa cultura —, há que se tomar medidas cabíveis para o resgate da dignidade do clássico Gre-Nal. E isso, só pode ser feito juridicamente, já que a vontade dos dirigentes é levada pelos interesses políticos e de ocasião.
Uma idéia que pode ser adotada pelo Governo estadual ou municipal é que se estabeleça o tombamento do clássico Gre-Nal, como patrimônio cultural.
A Constituição Federal no seu art. 216 estabelece que o poder público, com a cooperação da comunidade, deve promover e proteger o “patrimônio cultural brasileiro”. Dispõe que o patrimônio se constitui de bens materiais e imateriais que se referem à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, como as formas de expressão; os modos de criar, fazer, viver as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais.
Dentre esses bens, que formam o patrimônio cultural, podemos situar o Gre-Nal como uma manifestação esportivo-cultural brasileira e gaúcha, que pode ser compreendido como expressão e modo de viver da nossa gente, pela tradição e costume que compõe o imaginário social.
Um dos efeitos, entre outros, seria a disciplina jurídica de sua realização com controle pelo Poder Público, com regras claras e eficazes, onde, por exemplo, o interesse público da sociedade estaria acima do interesse privado de clubes e sócios, inclusive com a venda igualitária de ingressos, em cada estádio, para ambas as torcidas. Talvez isso pudesse dispor uma forma de se retomar a organização de um espaço coletivo em nome da preservação da memória e da cultura dando um basta à violência.”
*Advogado e professor universitário
Postado por Wianey
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